Insónias...
O relógio marca o passo constante, rígido e austero… Enquanto isso, o vento uiva descontrolado, despindo algumas árvores já seminuas, despojando-as das suas folhas douradas enquanto se delicia a fazê-las dançar.
Já é tarde e a escuridão envolve o mundo, engolindo e embalando-o nas suas entranhas…
Em alturas como esta sinto-me fragmentada em milhares de partículas, partículas diluídas neste vasto universo… É como se, por alguns momentos, pertencesse a toda a gente e a ninguém.
Nestas horas mortas, abandonadas, o sono escapa-se. Ele foge e rodopia, e eu fico sem saber quem sou. As noites tornam-se longas e os pesados minutos tornam-se companheiros da impaciência tortuosa.
Ouço os sons perdidos da rua e afundo-me ainda mais nas almofadas.
Acabo por desistir.
Levanto-me. Dirijo-me à janela do meu quarto e abro-a.
Deixo o ar selvagem entrar.
Cumprimento-o, e ele sussurra-me ao ouvido segredos perdidos no tempo - memórias desvanecidas, confidências murmuradas - enquanto brinca com o meu cabelo, desalinhando-o ávidamente.
Fecho os meus olhos e inspiro profundamente. E neste instante, neste momento único, algo em mim grita para nascer.
Agarro nos meus cadernos, tento encontrar alguma página ainda virgem… e escrevo.
Escrevo cantando os meus demónios. Cantando sim! Exorcizando-os naquele pedaço de papel adormecido.
Trazendo-os à luz, livrando do meu pensamento todos estes medos, toda a tristeza passada e a angústia que pesa ancorada no meu peito ofegante.
E então, já cansada e exausta, continuo...
Rascunho, desenho palavras mudas e silenciosas, que a minha alma escuta mas a voz ignora.
Até que - por fim- vencida pelo sono e pelo negro manto da noite, adormeço.
Pois bem, doce amigo/a, apresento-te o 9 de espadas.
Esta carta manifesta-se assim… Através dos nossos receios mais secretos (imaginários ou não), das insónias e do pânico instalado.
Vulgarmente conhecida como a lâmina dos pesadelos e da sombra psicológica, ela guarda dentro de si uma profunda capacidade criativa pois pertence ao naipe de espadas, que é regido pelo elemento ar. Elemento este, associado à mente rápida e inquieta, e à intuição penetrante e visceral.
Tenho uma relação extremamente íntima e próxima com esta representante dos arcanos menores. A minha atividade cerebral é infinitamente mais rica durante a noite e, por esse motivo, desde cedo aprendi a lidar com as horas lunares. É assim que convivo com os meus fantasmas particulares e com estes episódios cíclicos. Escrevo, pinto, toco piano… Flutuo acordada, imersa na obscuridade.
Há uns tempos atrás conheci dois rapazes. Um deles , em noites como esta, descarregava a energia acumulada numa bateria improvisada - ainda bem que morava numa vivenda sem vizinhos à volta!! - já o outro, levantava-se a meio da noite para dar a volta ao quarteirão umas 50 vezes ( fico cansada apenas de imaginar um corta-mato nocturno…Uff ! ).
Sim, porque por vezes é preciso drenar. E não faz mal reconhecer que todos nós passamos por períodos de ansiedade. Há que saber ouvir o nosso coração, o nosso espírito selvagem, a nossa intuição. Porque, se não o fizeres, “ela” surge durante a noite… Como uma sombra negra e sufocante, servindo de motivo ao teu despertar.
“Ela”. Aquela energia esmagadora, repleta de potencial criador ou destrutivo…
Basicamente, está nas tuas mãos aprender a gerir os teus impulsos. Tu deténs essa força e poder.
Mais ninguém.
Afinal, o controle é sempre nosso, não é assim?
E é neste registo que te deixo com uma questão:
Serão os nossos receios - furacões internos - fruto nascido de algo alheio a nós mesmos ou serão eles gerados na nossa própria psique? E , principalmente, o que podes fazer por eles?
Xx